Homeopatia - Ciência ou Superstição?
Autor do texto / Citação: Neto, Hermann Windisch
"Homeopatia : ciência ou superstição"
MONTFORT Associação Cultural
CONCEITO
O termo homeopatia vem do grego "homoios-pathos" (sofrimento semelhante) e designa a doutrina que prega a cura de doenças pela administração de substâncias que, aplicadas num indivíduo são, geram sofrimento semelhante ao do paciente.
O medicamento aplicado num indivíduo são causará artificialmente uma doença. Quanto mais semelhantes forem os sintomas do paciente, realmente doente, com os sintomas causados por esta substância, maior a eficácia deste medicamento para a cura deste doente. Por exemplo, a ingestão de café pode causar insônia.
SEU FUNDADOR
Christian Friedrich Samuel Hahnemann nasceu em Meissen, Saxônia, em 10 de abril de 1755.
A Medicina da época de Hahnemann era bastante precária, para não dizer perniciosa. Seus métodos eram ilógicos e agressivos, geralmente agravando os quadros clínicos e levando-os ao óbito. Os principais procedimentos terapêuticos eram:
1- Sangrias
O tratamento de muitas doenças tinha como base a retirada de sangue do paciente, em geral de 1 a 2 litros. Alguns recomendavam que a sangria fosse feita até a inconsciência para facilitar a redução de fraturas pelo relaxamento muscular e ausência de queixas.
As sangrias eram recomendadas em casos de Coqueluche, Cólera, Febre, e até mesmo hemorragias (o poeta Goethe, após sofrer uma hemorragia digestiva, foi sangrado em mais um litro).
As sangrias também eram feitas por meio de sanguessugas. Em 1833, a França importou 41 milhões de sanguessugas para completar sua produção. Os gastos hospitalares com estes animais chegavam a ser maiores que todos os outros medicamentos.
2- Eméticos/purgantes
O Calomelano (cloreto de mercúrio) e outras substâncias tóxicas eram recomendados como eméticos e purgantes, com a falsa idéia de que a diarréia e os vômitos provocados eliminariam as impurezas internas.
3- Vesiculações
A aplicação de substâncias cáusticas e irritantes sobre a pele (vesiculação) provocavam infecções na pele, e as supurações de pus eram também interpretadas como eliminações de impurezas internas.
Enquanto ficou na vila de Molschleben, traduziu o "Tratado sobre matéria médica", do Dr. Willian Cullen. Neste livro existia uma descrição dos efeitos da quinina (substância extraída da casca de uma árvore peruana e usada no combate da malária). Não satisfeito com a descrição dada, Hahnemann resolveu experimentar a raiz e descreveu os sintomas que sentiu como semelhantes aos sintomas da malária. Assim começa a pregação do princípio da similitude.
Em 1810, Hahnemann publica sua principal obra, o livro "Organon", que possui toda a base da homeopatia e toda a sintomatologia sobre várias substâncias experimentadas por ele próprio.
DOUTRINA HOMEOPÁTICA
O igual cura o igual
Este é o principal ponto da doutrina homeopática ("Similia similibus curantur").
Hahnemann quis justificar este princípio através de sua famosa experiência com o quinino.
Tomando por vários dias 4 dracmas (14 gr) de quina, 2 vezes ao dia, ele experimentou sensações de palpitação, pulso rápido e difícil, ansiedade, prostração, rubor facial e sede. Assim, ele quis explicar que a quina teria efeitos febris num indivíduo são e pela similia similibus curantur, a quina administrada a pessoas com febre teria o efeito de cura.
Porém, não é isto o que se observa na realidade:
"Desde que a quina tem sido tomada por pessoas e aplicada em animais, através das mais variadas formas, sem ter jamais produzido febre, ao contrário, tem sido demonstrado com absoluta certeza uma queda de temperatura. Os homeopatas de hoje devem ser assim, inventar um outro argumento para estabelecer a quinina como remédio em acordo com o princípio do similia similibus" (Prof. Behring - 1898 em Haehl, pg.38).
Vale realçar que no século XVIII o conceito de febre era muito vago, sendo o sinal patognômico da febre, para Hahnemann, o pulso rápido, rubor facial, sede, entre outros; sintomas tanto da hipertermia (febre) como da hipotermia (baixa temperatura).
Experimentação em pessoas sãs
Conforme o princípio da "similia", é necessário testar as substâncias medicamentosas em pessoas sãs para saber receitar a substância que causa os sintomas mais semelhantes ao do doente.
"... Pode-se sobrepor à doença a ser tratada, em particular se for crônica, o remédio que é capaz de estimular uma outra doença artificialmente produzida, a mais semelhante possível, e a anterior será curada - similia simillibus" (Hahnemann em Lafetá, 1989, pg. 133).
As diluições infinitesimais / dinamização
Como Hahnemann constatou a piora dos quadros dos seus pacientes com substâncias de acordo com a "similia", resolveu diluir os medicamentos em graus ínfimos.
Hahnemann, recomendava que a administração de todas as drogas fosse feita empregando-se a 30ª potência, um sistema de diluição que se constitui na diluição da suposta substância curativa da seguinte maneira:
Pega-se uma parte da substância curativa pura e dilui-se em 99 partes de solução alcoólica a 70% (i.e., 70% de álcool e 30% de água), esta é a primeira diluição ou primeira potência (CH1). Depois, da diluição resultante, toma-se 1(uma) parte e dilui-se novamente com 99 partes de solução alcoólica a 70%, sendo esta a segunda potência (C2). E a diluição se processa daí por diante.
Existe também a diluição em lactose (o açúcar é considerado inerte pelos homeopatas), a qual se processa pelo embebimento da lactose (ou mistura de lactose com sacarose) com a solução alcoólica descrita acima.
Verifica-se então que a solução da primeira potência (CH1) está diluída na razão de 1%, a (C2) está diluída na razão de 0,01%, a (C3) a 0,0001%, e assim por diante.
A 30ª potência corresponde a uma diluição de:
0,000000000000000000000000000000000000
000000000000000000000001%, i.e., 59 zeros
depois da vírgula
Daí o nome de diluições infinitesimais, que na verdade, só contêm solvente, sendo absurdo se cogitar que ainda haja substâncias ativas, como vemos nas declarações de Flávio Dantas, médico formado na UFRN, professor do Departamento de Clínica médica da Universidade Federal de Uberlândia, onde exerce a Clínica homeopática:
"A homeopatia, diluindo sucessivamente a substância básica, chega a diluições infinitesimais, onde teoricamente não deveria existir uma única molécula da substância original, ou seja, o medicamento homeopático passaria a não ser mais um agente puramente químico, e sim energético" (Dantas, pg. 31).
"Diluições homeopáticas exclusivamente energéticas são acima da 12ª diluição centesimal (C12)" (o grifo é nosso
Conservação dos remédios homeopáticos
Não se pode tocar no remédio, pois ele perderia sua energia: "...devem ser passados dos frascos para as tampas dos mesmos e dessas diretamente para a boca, sem serem manuseados" .
"Não devem ser guardados em locais expostos à luz solar direta, ou outras fontes emissoras de energia, como TV (principalmente em cores), magnetos e motores..."
Portanto, a homeopatia prega que tanto a causa das doenças como o remédio são imateriais.
POSIÇÃO DE ALGUNS PAÍSES SOBRE A HOMEOPATIA
A posição francesa
Em abril de 1984, a Academia Nacional de Medicina da França aprovou o relatório dos acadêmicos Hugues Gounelle de Pontanel e Herbert Tuchman Duplessis sobre homeopatia, cujo teor é o seguinte:
NÃO HÁ CONCESSÃO DE UM DIPLOMA DE HOMEOPATIA PELAS FACULDADES DE MEDICINA.
"Não negamos aos médicos o direito de acreditar nas virtudes da medicação dita homeopática. Pensamos, contudo, ser um dever de consciência protestar vigorosamente contra o projeto de concessão de um diploma de Homeopatia pelas escolas médicas, o que significaria oficializar seu ensino. A prescrição homeopática. no estado atual da ciência, NÃO É UM ATO RACIONAL, pois os fundamentos científicos de sua eficácia não foram comprovados. Não há qualquer razão para que a medicação homeopática não seja submetida às mesmas regras científicas de análise que se aplicam às outras terapias, e que não se faça um estudo controlado de sua ação com placebos, a fim de afastar o fator psicológico na sua atividade. É necessário lembrar que as autoridades do Ministério da Saúde só autorizam a comercialização de qualquer medicamento quando sua eficácia farmacológica é comprovada em conjunto com a ausência de efeitos secundários, por critérios objetivos. E uma comprovação que exige meses e até anos de trabalho. Por que os remédios homeopáticos fogem a esse imperativo?
O fundador da homeopatia imaginou que quantidades infinitesimais de um extrato vegetal ou mineral pudesse ter imensas virtudes curativas. Por conseguinte, os homeopatas tratam seus doentes com preparações diluídas à milionésima ou até à bilionésima escala; não é possível, para farmacólogos e toxicólogos, aceitar que a atividade terapêutica de uma substância aumenta com o seu grau de diluição, quando o que se verifica nas experiências é justamente o contrário.
De acordo com o nosso ponto de vista, trata-se de um logro, imposto à opinião pública e ao paciente, pretender induzi-los a crer numa terapia homologada por um diploma oficial das faculdades de medicina. É necessário sublinhar ainda o risco, para os doentes, de uma terapia cujo valor ainda não foi demonstrado. Seria oficializar a varinha de condão, ao lado do estetoscópio.
No estado atual de nossos conhecimentos é inoportuno autorizar a emissão de um diploma de Homeopatia pelas faculdades de medicina, como reconhecimento de uma prática cujas concepções se baseiam na metafísica alemã do século XVIII"(Non em Ladmann pg 61).
A posição inglesa
Em 1986, no seu relatório sobre medicinas alternativas, a British Medical Association afirmava que a homeopatia não tem base racional. Tendo entre seus pacientes a rainha Elisabeth e outros membros da família real britânica, a homeopatia tinha grande popularidade no Reino. O próprio príncipe Charles, usuário do método homeopático, pediu um estudo em profundidade das medicinas não ortodoxas.
A British Medical Association promoveu uma avaliação detalhada através de uma comissão formada pelas maiores sumidades médicas e farmacológicas da Inglaterra.
Em 1984, após extensa e numerosa análise dos dados obtidos, chegou-se à seguinte conclusão:
"O tratamento racional e científico no campo da medicina começou no século XIX. A homeopatia tem sua origem no século XVIII, quando, provavelmente, as curas alopáticas ocasionavam mais mortes do que melhoras no estado de saúde. Ao final do século XIX, a homeopatia era uma filosofia estática, inalterada, enquanto a pratica médica evoluía, baseada na compreensão da patologia, da fisiologia e da farmacologia.
Hoje em dia, os próprios homeopatas tem de curvar-se a essa evidência no tratamento de emergências cirúrgicas e clínicas e de doenças agudas e crônicas mais graves, que, sem os recursos da medicina ortodoxa, seriam sério perigo de vida. Os remédios homeopáticos só têm indicação naquelas doenças que normalmente se auto-resolvem, isto é, evoluem sem a intervenção médica.
Não existe base fisiológica para justificar a terapia homeopática, que consiste na administração de algumas gotas de remédios tão diluídos, que, nas diluições mais avançadas (as mais usadas), não contêm qualquer traço da molécula original. Os homeopatas clamam que no processo de diluições e sucussões sucessivas, libera-se uma energia vital e imaterial, e que essa energia é terapêutica.
Não achamos nenhuma evidência para essa crença. Se o médico homeopata acredita na realidade dessa força imaterial, ele pode transmitir essa crença ao seu paciente. O efeito placebo seria então a explicação do sucesso alcançado e compartilhado pelo homeopata e seu paciente" (Alternative em Landmann pg 62).
A posição soviética
Em carta oficial, o ministério da Saúde da URSS declarou:
"A homeopatia baseia-se numa representação idealista e não em fundamentos científicos. Ao longo de seus cento e cinqüenta anos de existência, ela não foi enriquecida por qualquer dado científico e utiliza fundamentalmente os princípios, os métodos e os procedimentos de cura estabelecidos desde o seu aparecimento. O arsenal dos meios utilizados pelos homeopatas permanece inalterado.
A medicina científica, fundamentada na compreensão materialista da morbidade e da cura como processo complexo e multiforme da correlação do organismo com seu meio ambiente, atingiu resultados extremamente satisfatórios na prevenção, detecção precoce e cura de inúmeras doenças, até então endêmicas. Os antibióticos, as preparações bacteriológicas, as vacinas e os soros disponíveis, após experimentação precisa e pesquisas científicas cuidadosas, permitiram o sucesso obtido pelas organizações de saúde na erradicação da varíola, da poliomielite, e no retrocesso brutal de outras doenças infecciosas.
Em nosso país, entre mais de meio milhão de médicos, os métodos e meios homeopáticos só são aplicados por grupos insignificantes. Isto testemunha que a grande maioria dos médicos não acredita e não participa nesses meios. E mesmo os que participam, fazem-no em conjunto com a medicina científica, o que retira da homeopatia seu caráter de independência" (Aulas em Landmann pg 63).
CONCLUSÃO
A homeopatia possui total coerência com a doutrina de Paracelso, Van Helmont e Stahl, que são doutrinas herméticas, mágicas e gnósticas.
O método homeopático das diluições infinitesimais e a própria doutrina homeopática da origem das doenças mostra uma concepção imaterial das doenças e dos remédios. Nesta doutrina é negada a causa material das doenças e a lógica de causa-efeito. Isto mostra o total afastamento da homeopatia com a ciência.
O método das dinamizações só pode ser coerente com uma doutrina esotérica, a qual afirma existirem "energias vitais" imateriais aprisionadas em todos os seres materiais (orgânicos e minerais).
A teoria das doenças crônicas, tão bem explorada por Kent, não pode deixar de ser vista como uma fuga de Hahnemann ao fracasso de sua doutrina. Uma conotação espiritualista desta teoria tentou fazê-la menos artificial ao esquema homeopático.
O principal argumento de Hahnemann para a teoria do similia similibus curantur, o caso da quinina para o tratamento da febre, é comprovadamente falso, sendo o mecanismo de ação da quinina o oposto ao pregado pela homeopatia.
As experiências feitas para provar a eficácia do método homeopático não conseguem fazer uma diferenciação palpável entre o medicamento homeopático e o placebo.
As ligações da Homeopatia com a seita de Swedenborg (USA), com as seitas mediúnicas e com o nazismo mostram a afinidade da homeopatia com o romantismo/ misticismo.
"Hahnemann, esta rara combinação de filosofia e sabedoria, cujo sistema deverá eventualmente provocar ruína das mentes comuns abarrotadas de receitas, mas que ainda é muito pouco aceito pelos clínicos, e muito mais evitado que investigado" (Goethe, Zerstr Blatter, vol II)
Por fim, podemos fazer uma consideração a respeito da tentativa de propor ao mundo duas correntes de pensamento, uma racionalista e outra mística esotérica. Portanto, encontraremos as seguintes relações:
Química
Alquimia
Astronomia
Astrologia
Medicina
Homeopatia (no Ocidente)
Matemática
Numerologia
etc...
A Homeopatia é, em suma, uma concepção esotérica espiritualista do mundo, aplicada à arte de curar.
IX. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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• KENT, J. T. "Filosofia Homeopática"Madrid, Casa Editorial Baily-Baillière. S.A., 1926.
• LANDMANN, J "As Medicinas alternativas: Mito, Embuste ou Ciência?" Ed. Guanabara, 1987(?).
• NOVAES, R.L. "O tempo e a ordem sobre a homeopatia", Ed. Cortez Editora, 1989
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